Contos de Garotos – Capítulo 12 – A Vida Alheia
Contos de Garotos
Capítulo
XII
A Vida Alheia
No quarto, Corei estava assustado. Ele sentou-se na cama e olhou para Kirios que havia acabado de trancar a porta. Ao ouvir o som da fechadura fechando, Corei sentiu puro terror e desespero.
– Vamos brincar… – Kirios sussurrou.
O olhar cor de mel do veterano mirou a frágil figura que estava na cama. Kirios podia sentir o cheiro de medo, ele tinha uma sensibilidade única para decifrar o coração de suas pequenas vítimas. Ele ainda era jovem, porém aos poucos ia desenvolvendo sua habilidade de observação.
– Por favor… eu não fiz nada – Corei implorou num tom baixo. Sua garganta estava doendo pelo choro contido. Ele passou a mão por seus cabelos, jogando suas mechas louras para trás.
– Foi seu sangue que encostou no meu sangue – sussurrou.
– Eu não tenho culpa pelas atitudes de meus irmãos – choramingou.
– Irmãos são irmãos. O que mais me irrita é que você não se importa com seus irmãos… você está querendo que eu vá me vingar somente deles? – indagou com desprezo.
Corei travou, ele arregalou os olhos e ficou em silêncio. A resposta para essa pergunta era óbvia e por isso mesmo Corei se envergonhava. Ele sentia-se o mais fraco dos irmãos.
– Você quer que eu vá castigá-los em dobro? Que irmão patético você é – comentou, deixando um sorriso sádico desenhar-se no seu rosto – vou castigá-lo por isso também.
– Você não… é Deus para me castigar – disse baixinho algo que lhe perturbava há muito tempo.
O olhar de Kirios ficou indecifrável, porém não aparentava ter nenhuma emoção boa depois desse comentário. Ele deu alguns passos na direção da cama, ficando parado ao lado de Corei, olhando-o de cima.
– O que você disse? – indagou com a voz carregada de ódio.
O coração de Corei parou uma batida. Ele não conseguiria repetir tais palavras perante aquele olhar assustador. Mas seu coração estava dizendo a verdade, ele odiava ouvir pessoas usarem as palavras castigo como se fossem donas da verdade.
A mão de Kirios fechou-se no cabelo de Corei, puxando a cabeça do menor para trás, arrancando alguns fios de seus cabelos com a violência do puxão. O loirinho gritou e fechou os olhos e nesse instante os dedos de Kirios agarraram sua língua, prendendo-a e a puxando para fora.
As mãos de Corei fecharam-se no braço e Kirios. Ele tinha medo que aquele psicopata pensasse em arrancar sua língua. Entretanto, a força do veterano era absoluta, ele não conseguia se livrar daqueles dedos. Uma mão puxava sua cabeça para trás e a outra puxava sua língua. Estava em agonia.
– Repete – Kirios mandou num tom baixo e controlado. Sua voz era tão calma que quem a ouvisse pensaria que ele estaria acabando de acordar de uma longa noite de sono.
Corei fechou seus dentes nos dedos de Kirios, desejando livrar-se daquela dor, porém para seu desespero Kirios começou a rir baixinho, deliciando-se com aquela dor. No final, além de sádico e futuro psicopata, Kirios era masoquista também.
As mãos do veterano soltaram o corpo menor. Corei colocou sua língua para dentro e ficou com a boca bem fechada, ele olhou para cima com medo e viu que Kirios lambia o corte que seus dentes haviam feito nos seus dedos. Seu olhar mostrava prazer.
– “Esse cara… ele é doente” – Corei pensou, olhando para a porta e para a chave que estava pendurada na fechadura. Depois olhou para os lados pensando em como poderia fugir – “eu preciso ser mais corajoso”.
Um brilho misterioso chamou a atenção de Corei, ele olhou para o bolso da calça jeans de Kirios, vendo a ponta de uma lâmina fina e fria de metal. Com um movimento rápido, ele conseguiu puxar a lâmina do bolso do veterano, revelando um bisturi. Kirios ficou olhando para o loirinho com descaso e voltou a lamber seus dedos.
– “Ele nem reagiu” – pensou com surpresa – “ele acha que eu não vou ter coragem de furá-lo! Só pode ser isso…”.
– Tire a roupa – Kirios mandou no mesmo tom calmo e controlado – e não demore muito, eu ainda tenho que bater nos seus irmãos e sair para beber.
Corei levantou-se e correu até a janela, encostando-se a parede. Sua mão apontava o bisturi na direção de Kirios, o veterano o olhou e depois riu descontroladamente.
– Está com o lado contrário – ele disse – você não pode me furar assim.
Corei olhou para o bisturi e viu que a ponta de corte estava virada para seu estômago. O loirinho tratou de virar a posição daquele objeto e voltou a apontá-lo na direção de Kirios, com uma leve tremedeira.
– Vai embora – Corei gritou.
– Agora segurou certo – Kirios disse, colocando as mãos na cintura – eu adoro brincar com objetos cortantes. Não sabia que gostava também… quer me furar?
– O que?
– Indaguei se você quer me furar – disse, abrindo seus braços e virando seu corpo na direção do loirinho – fure onde quiser.
– “Ele é louco”.
– Anda! – riu alto.
Kirios aproximou-se lentamente de sua vítima que tremia e apontava o bisturi para ele. Porém Corei não teria coragem para cortá-lo, ele era fraco e jamais machucaria alguém. Quando a mão de Kirios fechou-se na sua mão, Corei viu sua derrota.
– Não é assim que se faz – Kirios disse, chamando a atenção de Corei.
A mão de Kirios pressionou a mão de Corei, fazendo o loirinho segurar o bisturi com mais força. Kirios começou a puxar a mão de Corei de encontro a sua coxa, fazendo a ponta do bisturi chegar até o jeans de sua calça.
– Tem que fazer assim… – disse, fazendo a lâmina cortar superficialmente sua pele – e depois pressionar assim… – a lâmina adentrou alguns centímetros na carne de Kirios, fazendo o jeans claro ficar manchado de sangue – e depois… você rasga! – e dizendo isso, ele começou a puxar a mão de Corei para cima, cortando lentamente a própria pele.
– PÁRA! PÁRA! – Corei gritou, tentando puxar seu braço para trás – SEU DOENTE! PÁRA COM ISSO!
– Não está gostando? – indagou com uma voz carregada de desejo.
– PÁRA! – implorou.
Kirios soltou a mão do loirinho que deixou o objeto cair no chão. O quarto ficou silencioso e no instante seguinte Kirios voltou a rir com muito divertimento. E para Corei, o homem a sua frente era um demônio. Nunca havia sofrido maus tratos graves naquele colégio, alguns assédios e ameaças, entretanto nunca foi realmente violentado.
De repente a risada de Kirios cessou e ele virou um tapa na face direita de Corei deixando o loirinho desnorteado. Ele deu um passo para o lado e se desequilibrou caindo sentado na cama. Kirios ajoelhou-se ao seu lado e voltou a puxar seus cabelos, porém desta vez Corei não gritou. Ele não daria sua língua para aquele sádico puxá-la novamente.
– Você aprende rápido – Kirios comento.
– “Por isso eu ouvi dizer que muitos garotos não abriam a boca quando estavam com Kirios… ele tortura você caso abra a boca”.
– Gostou de me cortar?
Corei balançou a cabeça negativamente.
– Eu gostei – murmurou – posso te cortar?
Corei voltou a balançar a cabeça negativamente com mais força, fazendo seus fios aloirados moverem-se.
O corpo de Kirios deixou-se inclinar para baixo, ele tocou seus lábios nos lábios de Corei que continuou com a boca fechada, ele odiou aquele toque nos seus lábios. Corei tinha nojo de homens.
– Abre a boca – mandou.
Porém Corei continuou com a boca fechada. Kirios começou a abrir aquela boca com os dedos, tendo um pouco de dificuldade até que conseguiu deixá-la aberta.
– Não feche!
A língua de Kirios adentrou na boca do menor, deslizando por cada cantinho daquela cavidade úmida e tão desconhecida. Corei não se moveu, ele sentiu vontade de cuspir.
– “Nojo, nojo, nojo… Gay maldito. Merdinha… puto” – pensava com desprezo – “que nojo… maldito…”.
As mãos de Kirios deslizaram pelo corpo do menor, sentindo como ele era magro. A camiseta de Corei começou a ser puxada para cima e com um pouco de dificuldade e boa vontade Kirios a retirou, jogando-a no chão. Corei abraçou seu corpo e olhou para o veterano.
– Você não é nada sexy – Kirios murmurou.
Kirios ergue-se e abriu o botão de sua calça puxando o zíper em seguida, ele desceu sua calça até o chão juntamente com sua cueca, voltando a sentar-se na cama.
– Sabe o que fazer – Kirios disse, segurando seu membro – e eu estou impaciente.
Corei ia abrir a boca para falar alguma coisa, mas um tapa forte e certeiro virou sua face com força para o lado esquerdo. O pescoço de Corei estralou com o ato, havia doído.
– Eu não dei permissão para falar. Use sua língua para outra coisa ou eu a cortarei – sussurrou.
A mão de Kirios puxou os cabelos de Corei para baixo, jogando a cabeça do loirinho na direção do seu membro. Corei fechou os olhos e depois os abriu lentamente vendo que havia um pênis na frente de seus lábios. Aquilo era o seu terror.
– “Imagine que é uma garota! Imagine que é uma garota” – pensava, colocando aquele membro lentamente na sua boca, sentindo um pouco de ânsia – “Imagine que é uma garota! Imagine que é uma garota” – ele passou sua língua pela extensão daquele membro e começou a chupar lentamente – “não dá para imaginar uma garota… não dá”.
Os cabelos de Corei começaram a ser torcidos e puxados. O loirinho chupava o membro de Kirios lentamente, ouvindo alguns suspiros impacientes do veterano.
– Desisto – Kirios disse – você não serve para isso. Eu até fui gentil, mas algumas pessoas não merecem piedade.
Kirios empurrou Corei com violência para baixo, fazendo o loirinho cair da cama e bater sua cabeça contra o chão frio. Kirios vestiu-se e passou a mão por seu moicano, jogando seus fios para trás.
– Você é um pedaço de carne – disse.
– “Essa expressão… apenas terroristas usam essa expressão com relação a humanos. Eu li a respeito disso. O que esse idiota tem na cabeça? Ele é um adolescente como eu…” – Corei pensou com angústia.
– Humanos são pedaços de carne – tornou a falar com um olhar febril.
– Até seu irmão? – Corei indagou com receio.
– Todos nós – respondeu friamente.
– “Louco”.
– Louco – Kirios sussurrou.
Corei arregalou os olhos assustando-se com aquela leitura rápida que Kirios havia feito de seus pensamentos. O loirinho encolheu-se no chão do quarto, abraçando seus joelhos. Ele estava com mais medo que antes.
O corpo magro de Corei foi jogado na parede e a partir dali ele recebeu uma sucessão de tapas e socos que foram direcionados a região de seu abdômen. Aos poucos Corei começou a ficar cada vez mais fraco, cuspindo um pouco de sangue interno. Ele ajoelhou-se no chão e caiu de bruços.
Kirios pegou sua perna e começou a arrastá-lo para o banheiro, ele abriu a tampa da privada e puxou a cabeça de Corei, afundando-a no vaso sanitário, mergulhando sua cabeça na água. Corei se debateu após sentir falta de ar. Enquanto isso a risada de Kirios invadia os ouvidos da sua vítima.
Quando os movimentos de Corei começaram a ficarem mais lentos, Kirios o puxou para fora daquela tortura. O loirinho abriu a boca buscando o máximo de ar que pudesse. E no instante seguinte Kirios voltou a afundar sua cabeça, retirando-a quando Corei ficava com os movimentos lentes. Kirios ficou um bom tempo na brincadeira até que Corei começou a ficar sem forças.
– Vou pendurá-lo numa árvore de cabeça para baixo – Kirios avisou, dando um chute no loirinho que se ergueu e caminho até o quarto com a cabeça baixa, chorando baixinho.
Kirios saiu do banheiro e destrancou a porta, ele aproximou-se de Corei e pegou seu bisturi que estava no chão, colocando novamente no seu bolso.
– Fiquei aí – disse, voltando ao banheiro, fechando a porta.
OoO
No quarto do andar de cima, Hanz caminhou até a cama do moreno, sentando-se nela rapidamente, segurando sua cabeça com as mãos, pensando no sofrimento que seu amigo deveria estar sofrendo agora.
– Ele deve estar querendo morrer – Hanz comentou.
– Sim – Kim concordou, sentando-se ao lado de seu namorado.
– Você poderia fazer a cabeça de Kirios – Hanz sugeriu.
– Não poderia. É mais fácil ele fazer minha cabeça. Kirios sabe dialogar muito bem – disse – isso se deve ao fato dele não parar de ler um segundo sequer. E ele está acostumado com as pessoas lhe fazerem as mesmas perguntas, por isso ele já tem uma resposta pronta.
– Claro que está acostumado. Ele age feito um louco! – disse com revolta.
– Sim. O que mais indagam é: você é louco? – disse – Kirios já tem a resposta na ponta da língua.
– Como conseguiu fazer amizade com um cara daquele? – Hanz indagou, deixando seu tronco cair para trás.
– Foi difícil no começo, mas depois acabei me acostumando com o jeito despreocupado de Kirios. Ele não dá muito valor às coisas. Ele não liga para roupas, dinheiro, seu corpo e nem com a vida dos outros. Ele só pensa no irmão dele – comentou, analisando melhor seu amigo.
– Ele é possessivo. Eu tenho pena de Alexis – comentou – imagina eles no futuro. Alexis não vai poder fazer nada… Kirios sempre estará lhe vigiando.
– Sim, mas não é tão terrível quanto parece – murmurou – já viu como Alexis se comporta também?
– Não. Nunca os vi juntos – disse – só um beijo ou outro… mas nada demais.
– Alexis é parecido. Ele é ciumento também e gosta da proteção do irmão apesar de ficar reclamando – revelou – eu já os vi juntos. E uma vez… até mesmo Alexis brigou com Kirios por ele estar afastado.
Hanz voltou a se sentar na cama, ficando curioso com aquele assunto, esquecendo-se completamente de Corei.
– E Kirios já ficou com alguém de verdade? Tipo… já gostou de outro? – Hanz indagou.
– Uma vez – revelou – mas não comente com ele. Pois aquele tempo foi tenso.
– Me conta! – pediu.
Kim sorriu e deu um beijo nos lábios de Hanz.
– Um aluno novo do primeiro ano deixou Kirios balançado. E pela primeira vez ele fez um acordo – revelou – e não tocou em Alexis em momento algum. O irmão dele ficou revoltado e exigiu que Kirios cancelasse o acordo.
– E o que aconteceu?
– Kirios ficou dividido. Nessa época ele estava melancólico e vivia bebendo e usando algumas drogas também. E num dia, Alexis apareceu no quarto e exigiu que Kirios escolhesse com quem ficar.
– Que terrível! Esse irmão dele é louco também – comentou – e o que Kirios fez?
– Escolheu o irmão – respondeu.
– E o outro aluno? Quem é? – indagou.
– Ele está no segundo ano agora – comentou – e ele está estudando com Alexis. Eles não se falam obviamente.
– E o Kirios aproxima-se dele? – indagou com excitação. Aquela fofoca estava sendo a melhor de todas.
– Às vezes eu o pego o olhando, mas ele diz que está vigiando seu irmão – disse – eu duvido muito.
– Eu já o vi analisando a aula de educação física do segundo ano. Será que estava vendo esse garoto? – indagou, lembrando-se da conversa que teve na arquibancada com Kirios.
– Provavelmente – respondeu – o nome dele é Mahoma.
– Como ele é? – indagou, pensando nos garotos do segundo ano.
– Maior que você… e tem cabelos negros e cacheados… hum… olhos castanhos claros – respondeu.
– Ele tem o braço inteiro tatuado? – Hanz indagou.
– Esse mesmo – disse, pensando em como podia ter esquecido daquele pequeno detalhe para descrevê-lo.
– Ele é bonito – Hanz comentou – “ele é muito bonito mesmo. Eu lembro que fiquei um bom tempo o olhando quando o vi” – pensou.
– Hum… tem razão – Kim disse – e Kirios fica um pouco pensativo quando o encontra.
– E… eles se falam?
– Raramente – revelou – por que o interesse?
– Seria bom arranjar alguém para Kirios – disse – essa relação com o irmão não ajuda em nada.
– Não se meta no que não é da sua conta – Kim pediu – Kirios ficará puto da vida se souber que você pensa assim. E o irmão dele vai querer lhe matar.
– Não me importo. Afinal você é meu cão de guarda – disse, rindo alto – eu tenho que aproveitar esse status.
– Ah… vai ficar correndo até mim pedindo proteção? – Maccario indagou, rindo baixinho, não acreditando em como Hanz falava tão facilmente algo tão cretino.
– Claro. Eu não sou besta – respondeu – óbvio que eu vou usar seu nome. Kim o torturador! Se você me fizer mal… eu solto meu cachorro!
– Ca… cachorro?! – indagou indignando-se com o apelido ‘carinhoso’ de seu namorado.
– Brincadeira! – disse, dando um beijo rápido nos lábios de Kim, que ainda o olhou contrariado.
– Não fique arranjando encrenca, Hanz – pediu, passando a mão pela face de seu namorado.
– Eu só queria saber se Kirios gosta desse rapaz. E diga-me, ele tem acordo com alguém?
– Não – respondeu – mas ninguém fica correndo atrás dele com muita intensidade.
– Por quê?
– Digamos que o último que o machucou realmente teve os seus ossos deixados à mostra por Kirios – comentou – entendeu?
– Hum… ele sabe dar bem o seu recado – comentou, olhando para Kim com atenção – e você também sabe dar seus recados.
– Obrigado, obrigado – agradeceu – será que ele já terminou com aquele pirralho?
– Ah! O Corei! – gritou, erguendo-se.
Kim riu baixinho, pensando em como seu namorado poderia se distrair tão rapidamente. No fundo Kim adorou deixá-lo distraído, essa era a forma mais fácil de segurar Hanz naquele quarto. Havia sido mais fácil do que pensava.
Hanz saiu do quarto apressadamente e foi até o seu dormitório, encontrando a porta entreaberta. O moreno adentrou rapidamente, encontrando Corei sentado no chão do quarto, abraçando seus joelhos, e sua cabeça estava entre seus braços e seus soluços eram ouvidos.
– Corei… – sussurrou o nome do menor, aproximando-se lentamente dele.
O choro de Corei era muito triste, o moreno sentou-se ao seu lado e passou o braço por seus ombros, abraçando-o delicadamente. Corei ergueu seu rosto exibindo um olhar carregado de tristeza.
– Já está aqui? – a voz de Kirios cortou o silêncio do quarto. Ele saiu do banheiro, jogando a franja do seu moicano para o lado.
– O que você fez? – Hanz indagou com ira.
– Imagine – respondeu, arrumando sua camisa.
– Vai embora – Hanz mandou.
– Não terminei com ele – disse – afaste-se.
– Então por que abriu a porta? – Hanz indagou.
– Porque eu ia sair com ele – respondeu secamente.
Hanz ergueu-se lentamente e lançou um olhar desafiador para Kirios que não se importou muito. O veterano fechou a porta e trancou, Hanz observou seus movimentos, ficando um pouco assustado com aquela atitude.
– Assim Kim não vem interromper também – murmurou.
– Vai me agredir também? – Hanz indagou.
– Só se você interromper – respondeu.
A mão de Kirios começou a tatear o bolso de sua calça, ele abriu um largo sorriso e retirou um pequeno bisturi. O brilho do metal chamou a atenção dos dois calouros.
– O que vai fazer com isso? – Hanz indagou – “ele não pode ser tão louco”.
– Gravar meu nome no corpo dele – respondeu – pode segurá-lo para mim, Hanz?
– O QUE? – indagou perplexo – você é estúpido? Não vou deixar você fazer isso!
A mão de Hanz fechou no braço de Corei que se ergueu lentamente, com a cabeça baixa.
– Pare de chorar e presta atenção Corei! – Hanz gritou, acordando o loirinho do seu transe – não vamos permitir que ele faça nada. Ajude-me!
O olhar de Corei teve um brilho esperançoso, ele teria Hanz para lhe proteger, mas só de lembrar que Kirios batia em vários garotos de uma vez a esperança de Corei voltou a desaparecer.
Kirios colocou o bisturi no seu bolso, deixando pronto para pegá-lo quando fosse o momento. Por hora precisava nocautear sua vítima. Ele avançou ficando a alguns centímetros dos dois.
– Poderia sair Hanz? – Kirios indagou – ou vai querer apanhar também?
– Vai ter que me bater, pois daqui eu não saiu – disse, mantendo-se firme.
– Eu… eu… vou te ajudar – Corei disse, tremendo levemente.
– Um complô, hum? – riu baixinho – interessante. Kim vai ficar bravo comigo, mas você não me deixa outra escolha, Hanz.
A mão de Kirios fechou no braço de Hanz, começando-o a puxar para longe de Corei. O loirinho reuniu toda sua coragem e fechou suas unhas no braço de Kirios, tentando soltar Hanz ao mesmo tempo em que começou a chutar suas pernas.
– “Isso é o máximo que Corei pode fazer? Vamos apanhar…” – Hanz pensou, olhando para o largo sorriso que estava estampado na face de Kirios.
Duas batidas na porta chamam a atenção do trio. A voz de Kim invadiu o quarto.
– Kim! – Hanz gritou.
– Abre a porta – Kim pediu.
– O Kirios quer…
– Eu não vou fazer nada com Hanz, Kim – Kirios interrompeu – apenas vou deixá-lo quieto.
– O que? Kirios… solte-o agora! – Kim mandou, chutando a porta.
E vendo a situação atual Kirios não teve escolha, ele caminhou até a porta e a abriu. Kim adentrou no quarto rapidamente e olhou para seu namorado, constatando que ele estava bem.
– O que pensa que ia fazer? – Kim indagou.
– Jogá-lo no banheiro – Kirios respondeu – não ia agredi-lo.
– Ah… bom – Kim ficou aliviado. Pelo menos Kirios tinha consideração para com ele.
Hanz aproveitou esse momento de distração e puxou Corei para fora do quarto, eles começaram a correr. Kirios ficou indignado com a atitude dos calouros e começou a correr atrás deles, sendo seguido por Kim.
A situação estava tensa. O quarteto corria pelo colégio, Corei e Hanz poderiam ser fracos, mas sabiam correr muito bem. Os outros alunos pararam para observar essa brincadeira de pega-pega. Em certo momento, eles pararam no refeitório, agora Kirios tinha obstáculos, que seriam as mesas e cadeiras.
Um grupo grande de garotos ficou em volta do refeitório olhando a situação. Havia garotos de várias turmas, eles olhavam para Kirios e Kim que estavam discutindo alguma coisa.
– Eu não vou pegar seu namorado, Kim – Kirios disse – fale para ele soltar aquele idiota.
– Hum… se o machucar, Kirios, eu vou matá-lo – disse baixinho.
– Eu não vou – avisou – agora peça para ele se afastar.
Kim suspirou. Aquela situação estava ficando cada vez mais tensa. Ele não deveria ter permitido que Hanz saísse do quarto. O karateca avançou na direção dos dois, sozinho, porém Hanz sabia seu destino, então ele correu para o outro lado com Corei.
Kirios foi na outra direção. Eles poderiam cercar melhor a área, o loiro veterano estava se aproximando.
– Hei, Kirios. Por que não mexe com a gente?
O loiro olhou para o lado vendo os gêmeos Honoi. Eles pararam ao lado de Hanz e Corei. Hanz finalmente soltou o braço de Corei e afastou-se, caminhando até Kim que fechou a mão no seu braço.
– Agora você não foge mais – Kim disse com uma voz ofegante.
– Eu não podia deixar o Kirios cortar o menino – disse.
– Ah… eu te entendo Hanz. Eu faria o mesmo no seu lugar – disse – agora vamos embora.
– Não, eu quero ver o que vai acontecer – Hanz disse.
– Vai acontecer uma briga. Você sabe disso – comentou – e eu acho que vai ser mais feia do que pensei.
Alguns garotos do terceiro ano postaram-se ao lado dos irmãos Honoi, mostrando que não iam tolerar mais o sadismo de Kirios. No entanto, o veterano também tinha seus amigos, alguns alunos inclusive Julian ficaram ao lado de Kirios.
– “Isso ficou realmente sério” – Hanz pensou – “vai ter uma briga feia”.
– Vai ser um massacre – Kim riu baixinho – terceiro ano versus quarto ano. E tudo porque vocês ficaram correndo.
Hanz suspirou, ele sentia-se culpado e aliviado ao mesmo tempo. Pelo menos não deixou seu colega ser marcado por Kirios como se fosse um gado qualquer.
Os alunos do primeiro e segundo ano ficaram indecisos a qual lado torcer. Alguns simpatizantes de cada grupo moveram-se para cada lado, a fim de se envolver naquela briga também.
Leon e Hudi estavam num canto, eles não iam se envolver. O volume dos garotos do quarto ano era maior, os calouros do segundo e primeiro ano estavam soltos e logo fugiriam ou iam aderir para o lado mais forte, pois a briga era momentânea e no dia seguinte o quarto ano voltaria a reinar. Por que arranjar briga por causa de outras pessoas com os garotos mais encrenqueiros do colégio?
– Hanz, poderia me fazer um favor? – Kim indagou.
– O que seria?
– Poderia sair daqui e ir para o meu quarto? – pediu.
– Eu quero ficar aqui – disse.
– Por favor. Eu te peço – pediu com uma face cansada – eu estou te pedindo como seu namorado. Você fez o que podia e seu amiguinho está ali, são e salvo.
– Eu não vejo ninguém são e salvo – resmungou.
– Por favor… – Kim pediu.
– Hum… eu… vou ficar num cantinho… – Hanz disse, olhando para os azuis cobalto de Kim.
Uma carícia nos cabelos de Hanz foi o suficiente para ele se mover, com passos lentos Hanz começou a sair do refeitório, ficando num canto bem afastado. Agora ele olhava tudo ao longe, ao seu lado sentaram Leon e Hudi.
– Não vão se envolver também? – Hanz indagou.
– Não sou louco – Hudi disse – Haziel sempre causa problemas, eu cansei de pagar o pato por ele.
– E meu primo vai me arrebentar se eu tomar partido – Leon disse – ele sempre fica pegando no meu pé.
– Não reclame. Pelo menos Julian não ia deixar baterem tanto em você. Agora eu não tenho proteção aqui, eu ia apanhar – Hudi reclamou – vocês dois são sortudos. Kim e Julian são influentes.
– Arranje alguém do quarto ano, então – Hanz disse – deve ter algum querendo um acordo.
Hudi riu baixinho, não era fácil propor isso. O mais fácil era um aluno do quarto ano rir da cara dele, pegá-lo num canto e depois o jogar fora para outro usar. Por que fazer acordo se sabe que ele sempre estará lá para o que der e vier?
– Eu ouvi que um garoto gostava de você – Hanz comentou, lembrando-se de uma conversa que ouviu entre Julian e Romeu na semana passada.
– Quem? – Hudi e Leon indagaram em uníssono.
– Hum… eu acho que ele se chama… Miles – disse com incerteza.
– Miles? O Miles? – Leon começou a rir baixinho.
– O que tem? – Hanz indagou sem entender.
– Não quero nada com ele – Hudi disse – aquele cara é um chato. Ele vive pegando no meu pé.
– Ele não é legal? Ele é estranho? Me contem! – Hanz pediu.
Leon deitou-se no gramado e ficou rindo baixinho, Hudi estava um pouco vermelho. Ele não estava agüentando as risadas de Leon.
– Ele é estranho. Não fala com ninguém, não anda com ninguém, entrou no quarto ano no começo do ano… e quando foram falar com ele para saber como ele era, ele simplesmente jogou uma garrafa na cabeça dos alunos – Leon disse, no meio de suas risadas – meu primo tentou falar com ele, mas ele é meio doido. Eu acho que deve ter algum retardamento mental.
– Mas não entram alunos assim aqui – Hanz disse, lembrando-se do processo seletivo do colégio Saint Rosre.
– Sim. Ele deve fazer isso para pensarem que ele é louco, ninguém se aproxima – Hudi comentou – mas ele vive me olhando, me seguindo… e falando nele. Olha ali ele sentado numa das mesas, tomando alguma coisa como se nada tivesse acontecendo!
Hanz e Leon olharam para onde Hudi apontava. Hanz forçou mais sua visão, notando que o rapaz parecia ser realmente estranho. Ele tinha a cabeça rapada com poucos fios negros crescendo, ainda podia ver a cor do seu couro cabeludo. Ele tinha um cavanhaque e fumava, enquanto bebia café. Ele usava uma camiseta preta e uma calça jeans da mesma cor.
– Ele não é feio – Hanz comentou.
– Mas é estranho – Hudi disse – eu não quero ficar sozinho com esse cara.
Leon voltou a rir, caindo no gramado. O trio parou de conversar quando um grupo de garotos começou a se afastar do refeitório, eles voltaram suas atenções para a briga.
No refeitório, quando Kim ficou ao lado de Kirios e os demais, alguns alunos que estavam do lado dos irmãos Honoi se afastaram. Ninguém queria ser hospitalizado pelo karateca.
– Pelo jeito isso será injusto – Julian comentou – vamos pegá-los e arrastá-los ao vestiário. Ê Kirios… você adora uma bagunça… Olha a confusão que você fez.
– Eles bateram no meu irmão – Kirios disse.
– Bateram? – alguns alunos indagaram em uníssono.
– Apenas eu bati no seu irmão, seu filho da puta… vamos brigar então. Somente eu e você! – Haziel gritou, dando um passo à frente.
O clima ficou menos tenso. Kirios sorriu e deu um passo a frente também. Agora não seria mais uma guerra entre turmas e simpatizantes. Seria uma briga de irmão para irmão. Haziel irritado pela agressão que seu irmão menor sofreu e Kirios pelo mesmo sentimento.
Amín puxou Corei pela mão e se afastou, juntamente com os outros alunos. Haziel começou a caminhar na direção de Kirios e a cena a seguir foi tensa e bastante previsível. Kirios simplesmente colocou o maior no chão de tanta pancada que deu.
No gramado, Hudi, Leon e Hanz fechavam os olhos a cada pancada que Haziel tomava. Como uma pessoa menor que Haziel poderia bater nele daquele jeito?
– Olha só, alguns alunos do quarto ano estão vindo para cá – Hudi comentou – mas que inferno. Desta vez eu não me envolvi. Eles vão me encher o saco…
Alguns garotos do quarto ano pararam na frente do trio, eles ignoraram Leon e Hanz, pois eles já tinham seus cães de guarda. Seus olhares estavam voltados para Hudi, o ruivo se encolheu, temendo o que viria.
– Seus amigos são bem encrenqueiros – um deles falou – não acha Hudi?
– Eu não fiz nada – o ruivo respondeu.
E para a surpresa dos demais, Miles apareceu no meio dos garotos, olhando-o com seus olhos negros e inexpressivos. Ele abriu um sorriso exibindo seus dentes esbranquiçados.
– Vai querer brincar também, Miles? – um garoto perguntou, dando um passo para o lado, afastando-se um pouco.
Miles não disse nada, ele ficou olhando para os três veteranos que não sabiam como reagir. Eles foram se afastando deles praguejando alguma coisa, eles não queriam briga com nenhum garoto do quarto ano, ainda mais alguém tão estranho e imprevisível como Miles.
O trio de calouros ficou a olhar para Miles com curiosidade. Leon começou a rir baixinho, não se agüentando. Hanz sorriu e abaixou a cabeça, olhando discretamente para Hudi que encarava o veterano.
– O que quer? – Hudi indagou, porém como sempre Miles não respondeu. O veterano puxou um maço de cigarros, pegou uma unidade com a boca e o ascendeu com a chama de seu isqueiro.
Todos estavam em silêncio, o veterano sentou-se no gramado ficando de frente para Hudi que praguejou alguma coisa e voltou sua atenção para o refeitório.
– Hudi – a voz baixa e extremamente rouca de Miles invadiu o ouvidos dos demais.
Todos voltaram sua atenção para o veterano. Ele deu uma longa tragada no seu cigarro e ficou olhando para o ruivo com uma calma e paciência de um monge.
– O que foi? – Hudi indagou.
E depois de um bom tempo esperando uma resposta, Miles abriu a boca, voltando a falar.
– Eu queria falar com você – disse.
– “Esse homem deve ter cheirado tanto que nem consegue pensar e falar direito” – Hanz pensou, achando muito estranho o comportamento de Miles. Do outro lado, Leon estava surpreso. Ele nunca havia ouvido a voz do veterano antes.
– Pode falar – Hudi disse – o que você quer comigo?
– Eu quero você – respondeu com o mesmo tom, tragando seu cigarro e olhando com paciência para Hudi. Nem parecia que Miles havia dito algo tão constrangedor e possessivo, com esse tom de voz e olhar, podia-se dizer que ele havia dito algo banal.
– “Ele é estranho, mas é bonito e charmoso. Parece ser francês assim como meu ex-namorado” – Hanz pensou, observando o veterano discretamente.
Hanz e Leon abriram um sorriso maior e ficaram olhando para a expressão apavorada de Hudi, o ruivo abriu e fechou os olhos diversas vezes tentando processar aquele pedido.
– Não – Hudi respondeu rapidamente – eu nem te conheço! – disse em seguida – não sei como você é. Nunca falei com você antes. Você vive me seguindo, pare com isso.
– Isso te incomoda? – indagou no mesmo tom.
– Claro que incomoda! – gritou – você vive no meu pé, você é estranho, não fala com ninguém e sempre que alguém vai fazer com você, você ataca coisas nas pessoas – bufou de raiva.
A diferença entre Hudi e Miles era gigantesca. Enquanto Hudi gritava, ria, gesticulava seus braços e movia sua cabeça de um lado para o outro; Miles apenas observava a vida passar por seus olhos como se tudo fosse em câmera lenta.
O silêncio voltou, o trio ficou olhando para o veterano que se levantou, batendo suas mãos na sua calça para limpá-la. Ele fechou os olhos e ficou a saborear seu cigarro. Quando se deu por satisfeito, jogou o cigarro no chão e pisou, acabando com o fogo e a fumaça.
– Não quer um acordo comigo? – Miles indagou.
– Não!
– Por quê?
– Vou ter que repetir? – Hudi indagou num tom raivoso.
– Por que a raiva?
– Porque… porque… porque você me irrita – disse, cruzando os braços e olhando com intensidade para Miles, que soltou um longo bocejo depois desse ataque de Hudi.
– E por que eu te irrito?
– Porque você é lento, quieto e estranho. Não é evidente? – resmungou.
– Hum… interessante – murmurou.
– E olha só! Você não fala nada com nada – Hudi disse, apontando o dedo para o veterano – se eu te xingar, você não vai fazer nada. Você por acaso se drogou tanto que não tem mais células cerebrais?
– Eu não me drogo – disse no mesmo tom calmo de sempre – eu só falo o que acho necessário. Eu não sou estúpido, não sou burro, eu apenas ajo de acordo com a situação.
Era a primeira vez que Miles falou alguma coisa com nexo, Hudi acalmou-se um pouco, dando mais atenção ao veterano.
– Então por que não fala com ninguém? Por que ataca coisas nos outros?
Miles passou a mão por sua careca, sentindo que seu cabelo estava crescendo.
– Porque se eu me mostrasse receptivo na época eu seria um tolo. Afinal, esses garotos só desejam que você dê brechas para atacarem – sussurrou – e eu ataco as coisas, porque eu gosto.
– Talvez você seja mais espero do que pensei – Hudi comentou – mas por que eu?
– Vai saber… – Miles murmurou.
Hanz e Leon ergueram-se, chamando a atenção do ruivo que ficou desesperado.
– Vamos deixar vocês conversarem – Hanz disse – qualquer coisa estamos ali – avisou, apontando para um canto.
Leon e Hanz saíram rindo baixinho, adorando a cara de desespero de Hudi. Leon e Hanz sentaram mais afastados e olharam para Miles que se sentou ao lado do ruivo, que se afastou um pouco dele com um olhar desconfiado.
– E será que vai rolar? – Hanz indagou.
– Vai saber. Esse cara é estranho – Leon comentou – ele já atacou uma cadeira nos garotos. E acredita que ele já atacou um livro no professor de matemática?
– Não acredito, naquele velhinho? Coitado! – Hanz não acreditou – ele parece ser tão calmo.
– Os calmos são imprevisíveis, isso é o que meu primo vive dizendo – Leon comentou – e parece que a briga finalmente acabou. Mas o que você tem na cabeça e sair correndo pelo colégio com Corei, Hanz?
Hanz respirou fundo, ele olhou para Leon com atenção.
– Eu não podia permitir que Kirios o cortasse com um bisturi – comentou – diga-me. Você deixaria alguém cortar seu primo?
Leon ficou em silêncio, ele abriu um leve sorriso e respondeu:
– Não. Julian sempre me tratou muito bem, desde que éramos crianças.
– Eu senti a obrigação de proteger Corei também – murmurou – você acha que agi errado?
– Não. Você foi corajoso, eu invejo isso – disse – eu perdi muita da minha coragem nesse colégio. Eu deixei de ser o que queria, eu apenas me apoio no meu primo e ele não liga muito para mim.
– Não liga? – Hanz indagou – ele sempre procura te ajudar.
– Isso porque meus pais pediram – murmurou, parecendo chateado – ele me fala coisas frias e sempre me cutuca com coisas do passado. Julian sabe ser cruel quando quer, mas ele me trata bem. Sempre me tratou como se eu fosse… uma pessoa vazia.
– Já falou com ele sobre isso? – Hanz indagou com certa curiosidade. Ele nunca havia falado tão abertamente com Leon antes.
– Tentei… ele riu – revelou, deixando seus olhos encherem-se de lágrimas e nesse instante Hanz ficou desesperado. Ele sentiu vontade de abraçar o moreno e lhe proteger, amaldiçoando-se por ver aquelas lágrimas rolarem. Leon sempre se mostrou o mais forte do grupo e agora estava tão sensível. Era algo perturbador.
Hanz olhou para o refeitório e viu que os alunos estavam indo embora depois da briga. Julian e Kim estavam lado-a-lado com Kirios, puxando o loiro para fora do lugar. Quando conseguiram, Alexis apareceu e puxou seu irmão, apenas ele poderia acalmar Kirios.
– “Ah… Julian e Kim estão vindo aqui” – Hanz pensou – quer andar um pouco? Julian está vindo aqui.
– Ah… droga… eu não quero que ele me veja assim – Leon praguejou.
Os dois levantaram-se lentamente, Hanz começou a andar, puxando Leon para fora do gramado. Hanz fingiu não ouvir Kim lhe chamando, continuando a andar com o seu colega que começou a tentar secar suas lágrimas. Ambos ficaram andando sem rumo até que foram alcançados.
O primeiro a se aproximar foi Kim que puxou o braço de seu namorado, puxando-o na sua direção. Hanz largou Leon e olhou para Kim, exibindo um sorriso amarelo.
– Está surdo? – Kim indagou – eu estou te chamando há horas.
– Não seja exagerado – Hanz comentou, inclinando-se para dar um beijo rápido nos lábios de Kim, que sorriu com aquela carícia.
Julian passou pelo casal e se aproximou de seu primo com um largo sorriso no rosto. Leon estava de costas com a cabeça baixa, ele deixou-se ser abraçado por trás por Julian.
– Que bom que não se envolveu desta vez Leon – Julian murmurou – eu teria te espancado se aparecesse ao lado daqueles irmãos malucos.
– Que gentil… – Leon disse baixinho.
– Vem, vamos sair para beber com o pessoal – Julian disse.
– Eu… não estou a fim de sair hoje – Leon falou com uma voz fraca.
– Não? Por quê?
Julian virou o corpo de seu primo, olhando para seus olhos que estavam secos e brilhantes. Ele havia conseguido conter suas lágrimas, entretanto seu rosto estava triste.
– Estava chorando? – Julian indagou – por quê?
– Não estava – mentiu, abaixando seu olhar para o chão.
Julian riu baixinho e passou a mão pelos cabelos de Leon, numa leve carícia. O mais velho puxou o menor para fora dali, praticamente arrastando seu primo. Hanz viu a cena em silêncio, sentindo pena de seu colega.
– Leon está triste – Hanz comentou.
– Por quê? – Kim indagou, olhando para os dois se afastar.
– Julian o trata com frieza e sempre o cutuca. Foi o que ele disse.
– Eu não sei qual é a relação deles, mas eu concordo. Julian o trata com muita frieza quando quer – comentou – e você está se metendo na vida dos outros novamente. Eu não vou querer ver você correndo com Leon por aí… assim como correu com Corei.
– Ora! É diferente. O Corei ia ser maltratado – disse.
Kim ergueu suas sobrancelhas e ficou olhando para a face ingênua de seu namorado.
– E você acha que com Leon vai ser diferente?
Os olhos de Hanz arregalaram-se, ele voltou seu olhar para os dois primos que estavam cada vez mais longe. Hanz fez a menção de se mover na direção deles, mas foi segurado.
– Chega de encrenca por hoje – Kim pediu – você e eu sairemos para beber daqui a pouco. E chega de brigas. Kirios e seu irmão provavelmente vão juntos e não quero você brigando com ninguém.
Hanz fez uma cara emburrada, não acreditando naquela situação. Seus amigos foram agredidos por todos os amigos de Kim. Era uma situação difícil. No fundo desejava que ele e Kim saíssem daquele colégio, assim não teriam que tomar partido de nada.
As horas foram passando e os alunos saíram para beber conforme foi combinado para comemorar as medalhas de ouro e bronze de Kim e a medalha de ouro de Max, que se juntou com a turma com Cássio e outros garotos do quarto ano.
OoO Por Leona-EBM
Continua…